Renato Tapajós

Parceiro: Sementeia03/10/2016

Renato Tapajós é um cineasta brasileiro nascido no ano de 1943, em Belém, no estado do Pará.  É escritor e cineasta.  Aos dezenove anos mudou-se para São Paulo com o intuito de estudar Engenharia na Universidade de São Paulo, mas acabou cursando Ciências Sociais na mesma instituição. Lá conheceu várias outras pessoas que, como ele, também tinham interesse pelo cinema. Ainda durante os tempos de faculdade, fez documentários de denúncia; em 1968 entrou na clandestinidade e na luta armada. Ficou cinco anos preso em diversos órgãos repressivos da época.

No mesmo ano  (1968) , ingressa na clandestinidade e na luta armada. É detido e passa cinco anos na prisão, onde é vítima de tortura. Essas experiências resultam no romance Em Câmera Lenta, lançado em 1977, pelo qual é preso novamente durante um mês por incitação à subversão, processo pelo qual, posteriormente, responde em liberdade.

Tapajós sempre pensou em ser escritor, mas acabou envolvido pelo cinema e só escreveu seu primeiro livro em 1977, uma reflexão sobre o período de militância política. O livro foi censurado; mais uma vez, Tapajós foi preso, mas solto alguns dias depois. Em 1982, no filme Linha de montagem, ele documentou o fortalecimento dos movimentos sindicais, de onde surgiram diversos líderes políticos atuais.

Na década de 1990, ele se reaproximou da literatura. Começou a escrever pensando em dialogar com os próprios filhos adolescentes. Desse trabalho surgiram várias obras para o público jovem. O engajamento político e o não conformismo estão sempre presentes em suas histórias, que procuram estimular o jovem a ser membro ativo da sociedade em que vive.

O filme de Tapajós, nesse sentido, além da força inequívoca do retrato de época, se oferece como o mais acabado documento visual para se perceber as transformações sociais e políticas pelas quais o país passaria e que dariam o sentido das articulações de poder que finalmente levaram Lula à presidência da República em 2002. Mais do que mostrar a ascensão do líder sindical, e das condições e reivindicações trabalhistas da época, “Linha de montagem” traça subliminarmente o perfil político de Lula, um perfil cujos traços mais característicos estão prefigurados nas imagens captadas por Tapajós.

A força das reivindicações trabalhistas reside na organização e unidade dos trabalhadores. Trata-se, portanto, de um movimento vertical de baixo para cima. Sem a base de sustentação dada pela massa de trabalhadores, num momento em que a ditadura ainda era ativa, as greves teriam sido dispersadas e seus lideres devidamente calados. Mas, ao mesmo tempo em que se deve considerar o força vinda das bases, o que efetivamente impulsiona o movimento é a figura catalisadora e carismática de Lula.

O que se tem, então – sem que obviamente Tapajós tivesse a dimensão -, é o modo como a figura do líder se impõe nas esferas de poder. Vale dizer: a incrível intuição política de Lula para dialogar com a massa e negociar com as estruturas de poder. Nos termos do “Príncipe”, de Maquiavel, os movimentos de Lula eram – e hoje se tem isso como evidente – orientados pela capacidade de jogar com a virtu e a fortuna. Por isso, por conta dessa capacidade de jogar com as circunstâncias favoráveis, ele se manteve e se mantém na seara política.

“Linha de montagem” modela um personagem cujo destino está traçado nos gestos, na força expressiva do momento e das circunstâncias. Ainda que Lula não tivesse consciência disso, com a ditadura em seus estertores, dissensões políticas dos segmentos tradicionais, emergência de novas forças sociais, a inevitabilidade do vazio de poder, a ser ocupado por atores políticos germinados naquelas circunstâncias históricas. O grande mérito de “Linha de montagem”, com isso, é o de flagrar, nas entrelinhas, os condicionantes que fizeram de Lula a grande referência política no Brasil nos anos que se seguiram. Trata-se, por isso, de um filme fundamental para se entender tanto o teatro – ou a encenação política -, quanto a simbologia que gesta um momento e dita os rumos da história.

Entrevista

É nesse sentido que creio ser oportuno e conveniente ver, ou rever, “Linha de montagem”. Os críticos de cinema, não raro, falam de filmes datados, filmes que com o tempo perdem força expressiva e se mantém como arqueologia de um período. Dos filmes do ciclo, sinto que, talvez, “O Velho”, de Venturi, seja um tanto datado, na medida em que fica preso a um passado com verniz nostálgico. O Luiz Carlos Prestes de Venturi parece congelado no tempo. O mesmo não se pode dizer dos filmes de Tendler, tampouco do de Tapajós. Com esses filmes, em especial o “Linha de montagem”, uma compreensão necessária do Brasil dos dias atuais.

Para completar, deve-se chamar a atenção para o grave problema de distribuição de filmes no Brasil. Mesmo se tratando de um documentário de valor histórico inconteste sobre um personagem dominante na atual cena política, “Linha de montagem” está em catálogo porque Renato Tapajós, o próprio diretor, é responsável por sua distribuição.

Ou seja, não é um filme facilmente acessível. Isso revela um tanto das mazelas a que está submetida nossa produção cinematográfica. Mas revela igualmente que há um alerta que precisa ser apontado: louvemos a iniciativa da Cinemateca e do NEAMP; não nos esqueçamos, contudo, que iniciativas assim são esparsas, precisam, pois, ser estimuladas e continuadas; do contrário, filme como “Linha de montagem” continuará a ser visto por poucos e, com isso, quando se vê Lula hoje, uma compreensão torta do que ele efetivamente representa.

Filmografia como Diretor 

2014 – A Batalha da Maria Antônia

2014 – Corte Seco

2013 – O Fim do Esquecimento

2009 – O rosto no espelho

1984 – Em Nome da Segurança Nacional

1984 – Nada será como antes. Nada?

1982 – Linha de Montagem

1980 – A Luta do Povo

1968 – Vila da Barca

1967 – Um por Centro

1966 – Universidade Em Crise