O Movimento Estudantil e a greve da UFVJM em 2016

Parceiro: Olhares do Campo30/11/2017

 

 

Dando continuidade à publicação do dossiê Embates na Publicação Pública em 2016, segue abaixo o quarto texto do material. Produzido por graduandos da Licenciatura em Educação do Campo – UFVJM, consiste em uma análise da participação do Movimento Estudantil na greve docente de 2016, com foco na realidade da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri – UFVJM.

_________________________

 

 

O Movimento Estudantil e a greve da UFVJM em 2016

Jéssica Emanuely Vieira, Magno Santos Ferreira, Manoel Macedo Martins, Mateus Felipe Oliveira Santos e Vinícius Lima Cardoso

No centro de Diamantina, estudantes e servidores da UFVJM mobilizados contra a PEC 241. Fonte: UNE 2016.

Insatisfeitos com as crises política e econômica do Brasil pós-2014, universitários e secundaristas de Diamantina-MG saíram às ruas em 2016 como forma de manifestar sua inquietação. Os principais alvos seriam as decisões tomadas por governantes em relação à educação brasileira, como a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 241/2016 (que no senado se tornou a PEC 55/2016) e as reformas para o ensino médio impostas pela Medida Provisória (MP) 746/2016. Tais medidas desencadearam várias mobilizações em vários estados brasileiros. Particularmente, a greve docente da UFVJM teve início em 31 de outubro de 2016. Devido a inúmeras questões, alguns professores não eram a favor da greve e, só com o cancelamento do calendário, é que foram paradas muitas atividades de graduação na instituição. O principal intuito do movimento estudantil nesse contexto foi reivindicar a manutenção dos direitos dos estudantes. No meio de tanta luta, a greve só foi finalizada em janeiro de 2017.

Os dados obtidos para a produção deste texto foram produzidos a partir de conversas com membros do Diretório Central de Estudantes (DCE) da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), com alguns secundaristas membros do grêmio estudantil da Escola Estadual Professora Ayna Tôrres, popularmente conhecida por Polivalente, e de textos de movimento estudantil, como o do DCE da Universidade Federal de Uberlância (UFU). O processo foi bem produtivo, pois promoveu a interação entre membros do DCE da UFVJM, que também ocuparam a universidade, secundaristas de Diamantina e estudantes do curso de Licenciatura em Educação do Campo (LEC) da mesma universidade. Isso, sem contar com os outros pensamentos de movimentos estudantis utilizados como referência. E, para além do relato dos acontecimentos dos quais participaram os estudantes nesse processo, o diálogo realizado procurou levantar opiniões e análises diante das manifestações ocorridas.

Conforme o que foi relatado, o apoio dos secundaristas foi de suma importância para o desenvolvimento de todo o processo. Não por acaso o Polivalente, escola tradicional e extremamente conservadora de Diamantina, foi a terceira escola a ser ocupada em Minas Gerais e a primeira do município. O movimento, em todo o Brasil, chegou a mobilizar 1345 escolas. No entanto, segundo os secundaristas, a Secretaria de Estadual de Ensino tentava deslegitimar o movimento alegando que só alimentava a repressão. Mas os secundaristas resistiram e a partir de reuniões com seus pais, que até então não apoiavam as ocupações, por falta de informação e receio pelas críticas e denúncias da própria administração da escola, que acabaram por apoiar o movimento. Com o apoio conquistado, autorizaram seus filhos menores de idade a permanecerem na ocupação e passaram a contribuir ativamente durante o resto do processo.

A UFVJM de Diamantina, por sua vez, foi a primeira federal que teve sua reitoria ocupada no estado. Do ponto de vista da organização dos estudantes, optou-se por criar uma comissão específica com os manifestantes para dialogar com a reitoria em vez de colocar o DCE à frente desse papel. Essa medida seria uma forma de prevenção contra possíveis retaliações da universidade em relação à ocupação estudantil. No princípio da ocupação, ainda era permitida a entrada de funcionários no local, o que mudou em seguida, quando os estudantes resolveram isolar todo o setor. Na visão de estudantes envolvidos no processo, o principal obstáculo enfrentado foi a repressão que a todo o momento o movimento sofria, o que causava certo clima de tensão e acarretava brigas internas.

Em 29 de novembro, dia de votação em primeiro turno da PEC 55 no senado, alguns discentes, em linha com o histórico de luta do movimento estudantil, foram para Brasília protestar contra a aprovação da ementa e testemunharam ter sofrido muita repressão. Lá, a luta dos estudantes foi percebida como tendo um objetivo maior. Seria uma luta por todos, mas sem deixar de olhas o contexto social dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, onde a UFVJM tem por função trazer desenvolvimento para uma região que historicamente foi esquecida.

Um dos grandes questionamentos que se colocou em pauta nos diálogos com integrantes do movimento de ocupação era se greve ainda era a melhor e mais eficiente maneira de se reivindicar. Em resposta, afirmaram que a greve é um período de construção de conhecimentos que cria um ambiente mais forte para os discentes a partir da experiência política e dialógica.

Nesse sentido, é interessante notar que os movimentos estudantis possuem uma longa trajetória de luta na busca de melhorias na educação nacional. Segundo o Movimento Estudantil UFVJM (2009)1:

O movimento estudantil é o produto social e a expressão política das tensões latentes e difusas na sociedade. Sua ação histórica e sociológica tem sido a de absorver e radicalizar tais tensões. Em setembro de 1980, mobiliza cerca de um milhão de estudantes, numa greve geral de três dias, exigindo a anistia (ampla, geral e irrestrita) dos exilados e presos políticos, e em 1981, 400 mil estudantes realizam greve nacional diante da recusa do então Ministério da Educação e Cultura (MEC), em atender as reivindicações propostas pelos estudantes

A esse respeito, também pondera Mesquita (2003) que:

o movimento estudantil em geral foi bastante ativo e marcou, definitivamente, no século passado, sua presença no cenário político latino-americano. No Brasil, sua trajetória de certa forma remonta grandes momentos históricos, bem como, os principais fóruns e debates acerca da educação e dos modelos de universidade. Além disso, conseguiu, por algum tempo, ser o ator social de maior força e organização, atraindo outros grupos e movimentos sociais. (p. 117, 2003).

De acordo, ainda, com Markun2:

Em 1710 foram os jovens estudantes de conventos e colégios religiosos que enfrentaram a invasão francesa no Rio de Janeiro. Havia estudantes na inconfidência mineira, na campanha da abolição e na república.

Diante de tal histórico, fica evidente o quanto os movimentos estudantis foram importantes e participativos na construção social e política do nosso país. No entanto, ainda existem posicionamentos que vão contra a esse direito de reivindicação estudantil por meio da greve. Esse assunto foi abordado pelo DCE da UFU já em 2012, quando o coletivo apontou que: “mesmo após o reconhecimento da greve discente e repúdio aos atos que visem a sua limitação, ainda continua[ra]m a ocorrer atitudes arbitrárias, visando impedir o exercício desse direito estudantil”.

Aliás, um dos objetos de crítica dos estudantes na greve e nas ocupações de 2006 em Diamantina foi a postura da imprensa de um modo geral. Reiterando um histórico de estigmatizar na maioria das vezes os movimentos estudantis, a mídia procurou distorcer o real sentido das mobilizações. A visão apresentada pelos estudantes foi a de que, por serem organizações privadas, as corporações midiáticas representam interesses específicos que, inúmeras vezes, não condizem com os interesses da população.

Outro fator prejudicial às demandas do Movimento Estudantil da UFVJM, ainda em construção, foi a comparação com outras universidades já consolidadas. Olhando por esse lado, a UFMG, por exemplo, tem forças de atuação e vínculos com instituições tanto públicas quanto privadas, não tendo necessariamente a mesma preocupação com os cortes sugeridos pelas emendas e reformas do governo do que as universidades que estão em processo de formação e fortalecimento. A avaliação feita é que isso deveria ser motivo para maior mobilização por parte dos estudantes e funcionários de universidades novas como a UFVJM.

Em suma, podemos perceber que, assim como ocorreu ao longo da história, o movimento estudantil se mostrou presente com o intuito de defender e garantir direitos de estudantes e também de outros grupos, mesmo que convivendo com variadas formas de repressão. O cenário até hoje não é diferente. Diante disso, devemos legitimar o valor desse movimento e a força que ele tem.

Referências

DIRETÓRIO Central dos Estudantes (DCE) da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Direitos da greve discente. 2012. Disponível em: https://dceufu.wordpress.com/2012/05/28/direitos-da-greve-discente/. Acesso em: 26/01/2017.

ESTUDANTES que fazem História. Blog do Movimento Estudantil da UFVJM. Disponível em: http://cmeufvjm.blogspot.com.br/2009/10/estudantes-que-fazem-historia.html. Acesso em 29/01/2017.

MARKUN, Paulo. Movimento Estudantil. Disponível em: http://www.bradoretumbante.org.br/historia/movimento-estudantil. Acesso em: 28/01/2017.

MESQUITA, Marcos Ribeiro. Movimento estudantil brasileiro: práticas militantes na ótica dos Novos Movimentos Sociais. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 66, out./2003. Disponível em: https://rccs.revues.org/1151#authors. Acesso em: 27/01/2017.

UNE Notícias. Imagem. 2016. Disponível em: http://www.une.org.br/noticias/movimento-estudantil-presente-universidades-param-contra-pec-241/. Acesso em: 26/01/2016.

1 Em Blog do Movimento Estudantil da UFVJM, acessado em: 29/01/2017. http://cmeufvjm.blogspot.com.br/2009/10/estudantes-que-fazem-historia.html.

2 Em seu Blog, disponível em < http://www.bradoretumbante.org.br/historia/movimento-estudantil>. Acessado em: 28/01/2017.